quarta-feira, 26 de agosto de 2009

É Proibido Fumar

Eu já fumei bastante. Hoje sou ex-fumante chata. Daquelas que reclama da fumaça dos outros, não senta em área de fumantes dos restaurantes, detesta o cheiro impregnado de cigarro na roupa e no cabelo após uma noitada, repara bigodes amarelados, se irrita com vozes roucas de fumantes inveterados, e que tem nojo de bafo azedo de quem fuma. Moçambique está no caminho da civilização quando se trata em respeitar área de fumantes e não fumantes. Na verdade, em moz-português: fumadores. É, aqui não tem fumantes. Tem fumadores. Outro dia fomos em um restaurante e pedimos mesa na área de não-fumadores. Sentamos colados na divisa entre as duas áreas, que por sorte, eram separadas por uma porta de vidro. Percebi um adesivo com um aviso voltado para a área da fumaça. Achei que era tema pro meu blog, crente que o aviso estaria comunicando aos fumantes que era proibido fumar. Mas os dizeres superaram as minhas expectativas! O adesivo informava: “O Tabacco (repare os dois “c”, provavelmente uma onomatopeia do pigarro dos fumantes) é prejudicial para a saúde das crianças, mulheres grávidas, mães lactentes e não fumadores”. Bem, assim, concluo eu que, o tabaco faz mal pra todo mundo, menos aos próprios fumadores! Tirei foto.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Tráfico de Órgãos

É impressionante como assuntos macabros atraem a atenção dos seres humanos. Eu não sou diferente. Pode colocar no jornal uma manchete sobre os resultados da última conferência internacional sobre o desenvolvimento dos países africanos, os resultados das eleições na África do Sul, os impactos das mudanças climáticas na disponibilidade de alimentos, mas nada tem comparação com uma manchete que diz: “Suposto tráfico de órgãos humanos abala a cidade de Tete”. É claro que vou correndo ler aquele babado novo. Nossa! Antes da leitura já vou me perguntando: Será que estão dando aquele golpe do roubo de rins, largando o corpo numa banheira com gelo e um bilhetinho otário do lado dizendo: “procure um médico em 2 horas ou morrerás?” (lembra desse drama do boa-noite-Cinderela que circulou na internet?) Ou quem sabe seria alguma rede de milionários com problemas cardíacos enviando médicos assassinos capturar corações sadios no distante norte de Moçambique? Preciso ler a matéria imediatamente!!!
E é então, meu amigo, que começa a minha agonia. Leio aquela manchete tentadora, e ao ler o subtítulo já percebo que vai ser conteúdo para mais um caso no meu blog. O subtítulo dizia (prova na foto do jornal ao lado): “A polícia descobriu um corpo sem cabeça e sem órgãos genitais, facto que leva à suspeita de se tratar de mais um caso de extracção e tráfico de órgãos”. Gente, a piada não terminou aí, a matéria é toda uma PÉROLA digna de ser lida na íntegra. PRIMEIRO, o texto informa que foi encontrado um corpo sem cabeça e sem órgãos genitais, o que geraria, automaticamente, a suspeita de tráfico de órgãos. Alguém pode me explicar o nexo causal disso? Não percebi a conclusão lógica... Por que um corpo mutilado é consequentemente resultado de tráfico de órgãos? SEGUNDO, mais adiante a matéria informa que em outra margem do rio foi encontrada uma cabeça sem corpo. Bem, então concluo que a cabeça não é um dos órgãos que estavam sendo traficados, certo? Até porque, cabeça não é um órgão, até onde chega o meu limitado conhecimento de anatomia. TERCEIRO, alguém pode me explicar como se dá o tráfico de órgãos genitais? Deve haver um mercado para isso? Prefiro não entender. QUARTO, a foto apresentada no jornal não é a da referida ponte (conheço muuuito bem aquela área. Pegaram qq ponte e tacaram no meio da matéria). A legenda da foto diz ainda que foram encontrados órgãos humanos na margem norte da ponte... Ah! Então afinal acharam os órgãos que haviam sido traficados? QUINTO, após tecer sobre o assunto das cabeças, genitálias e tráfico, a matéria é concluída com um parágrafo sobre vítimas de acidentes de viação (rodoviários, no nosso português). Eu preciso de lógicaaaa!!!!!!!!!! Bem, preciso dizer mais algo?

sábado, 15 de agosto de 2009

A Muralha

Diz a lenda que a China que doou dinheiro para a reforma do muro do Gabinete da Presidência. O local ocupa um quarteirão inteiro, murado desde sempre. É proibido o trânsito de pedestres na calçada. Muitas vezes me pergunto: quem na face da terra cometeria um atentado contra aquela instalação? Mas tudo bem. Fato é que, como vc deve saber, Moçambique é um país que quaaaase não tem deficiências. Dono do quinto pior IDH (dentre os 179 países avaliados pela UNDP), expectativa de vida de 42 anos, e onde 66% dos adultos são analfabetos, então, conclui-se que o país pode se dar ao luxo de gastar o quanto quiser em infindáveis reformas de muros de suas instituições. Comecei a observar, diariamente, um enorme grupo de chineses empilhando tijolos e cimento, aumentando em aproximadamente 1 metro a altura daquele longo muro. Já achei aquilo um desperdício, mas ainda era só início de uma saga que já dura meses. Após o muro estar alto o suficiente, decidiram impor estilo ao mesmo. Começou um quebra-quebra profissional para adicionar quadrados perfurados, ranhuras e desníveis. Em seguida foi a fase do reboco. Um reboco como jamais visto na história da construção civil. Não medi (pq não podemos pisar na calçada do presidente), mas acho que eram aproximadamente uns 30 cm de espessura. Ao final do reboco, pintura branca. Ok. Achei que estivesse concluída a obra espetacular. Ha ha ha. Claro que não. Começaram e repassar o cimento devido às minúsculas rachaduras que se apresentaram na pintura... Após esta correção, a qual durou também questão de mês, trabalhado inclusive aos finais de semana (afinal, era uma obra de urgência), repintaram todo o muro. Achei que estava concluído afinal (estava atenta aos jornais locais, pois esperava uma inauguração com repercussão internacional, dada a dimensão do monumento), mas nãooooooooooo. Ainda faltava. Uma nova leva de chineses, provavelmente com experiência em porcelana real, começou o trabalho de desenhar finas canaletas para decoração da muralha. Claro que as finas canaletas eram feitas com cimento, por cima da terceira branca e alva demão de tinta da muralha. Quase surtei quando vi o estágio avançado da obra, a mil por hora, em pleno sábado. Bem, após os acabamentos, houve ainda mais uma demão de tinta, claro, para finalizar a belezura. Achei que estava pronto. Até que hoje, meses após o início da odisséia, ao passar em frente ao muro, avistei uma nova leva de trabalhadores... ESPANANDO o muro! JURO! Com as inúmeras reentrâncias desenhadas, houve espaço para juntar poeira e teias de aranha, as quais no momento, estão sendo cuidadosamente limpas (VEJA A FOTO!). Espero que meu imposto de renda não esteja contribuindo com as penas daqueles espanadores. Bem, seguindo a lógica do nosso Lula, pelo menos estão gerando emprego, né?

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Aromaterapia

Se tem algo que me irrita nessa vida é viajar de avião aqui na Suicinha (qualquer dia conto esse caso da Suicinha, mas hoje vou focar nos olores). Pra começar, nunca viajo pelo país de avião a passeio. Sendo assim, estressada com o trabalho ocorrido ou com aquele por vir, é que me empenho nas jornadas aéreas. No aeroporto (se é que se pode chamar assim aquela rodoviária de Bom Jesus do Itabapoana) já se inicia o meu ritual de desarmonização da alma. A área de check in é cercada por um tapume, pois, teoricamente, ali só poderiam “fazer fila” (já disse que isso não existe aqui, e não porque em moz-português fila é bicha, mas porque há mesmo uma limitação na condição humana para se organizar em filas) os passageiros. Todas as vezes, na entrada do tapume, os guardinhas pedem a minha passagem. Eu digo: “Senhor, eu tenho apenas o número do e-ticket, não tenho o bilhete em papel”, e eles ficam bem bravos comigo, mas acabam me deixando entrar. Ali, naquele espaço, principalmente no verão, começa a pressurização do ar. Viajar de avião é desestabilizar os chacras. As salas de embarque quando cheias, são praticamente um câmara de gás de Auschwitz. Dentro do avião então, preciso muito me espiritualizar, pois é um empurra-empurra, um colado no outro (mix de óleos essenciais), é um tal de passar quase por cima do outro, cafungada no cangote, levantamento de braços (Socorro!) para colocar quilos de malas no compartimento superior... E do meu lado sempre senta uma gorda. E aí começamos a assar dentro do avião enquanto esperamos resolver algum problema técnico(padrão), e já quase em transe, inebriada com o aroma ambiente, ligam a ventilação. Aí, meu amigo, sai aquele jato concentrado e direcionado ao nariz! Parece que a tubulação de ar recebeu gotas aromatizantes de óleo concentrado de CC Selvagem. E é nesse momento que eu evoluo e penso: se na aromaterapia cada olor tem seu efeito: Lavanda – relaxante; Hortelã – estimulante; Camomila – calmante; Coriandro- excitante; então, eu não tenho dúvida alguma, CC-Selvagem tem o poder comprovado: mau-humorizante!

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Copo D`água

As meninas que trabalham no meu escritório servindo cafezinho, são uns amores. Eu as trato super bem, e elas retribuem da mesma forma. No meu último aniversário me deram um presente e um cartão desejando que aquela data se repetisse por muitos anos, e com votos de “sucesso no teu trabalho, e que continues a ser a nossa estrela”. Fofas, ? Claro que não brigo com elas, nem nas circunstâncias mais malucas, como agora vou lhe contar. Estava aguardando algumas pessoas para uma reunião. Eu e minha colega de sala já tínhamos cada uma seu copo d’água, em posição de reunião na mesa, e os demais 3 convidados para a reunião estavam entrando na sala. Pedimos para uma das ajudantes para trazer então 5 cafezinhos e mais 3 copos. Claro que demorou um bom tempo... E quando já havíamos quase esquecido do pedido, ela entra na sala com os cafés e os 3 copos. VAZIOS. Os coloca na mesa e sai. Simples assim. Concluído o serviço. Nós achamos graça, e eles, ficaram com sede.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Almoço Padrão

12h20 Chego ao restaurante. Das 20 mesas existentes, apenas uma está ocupada. Com fumantes. A recepcionista quer me sentar ao lado deles. Ignoro-a e escolho eu mesma a mesa que vou me sentar. 12h25 Uma garçonete sorridente vem em minha direção. Finalmente. Peço logo uma taça de vinho branco. O almoço não será fácil. 12h30 Três velhos gordos portugueses entram no restaurante. Escolhem a mesa ao meu lado. Saco. Conversam alto. Pedem sopa de marisco. 12h33 Faço meu pedido. “Opção do Dia”. Entrada: sopa de vegetais (legumes, para nós brasileiros), prato principal: “Cabeças de Lulas Grelhadas”. Não quero a sobremesa. 12h45 Com um ângulo privilegiado, posso observar a saída da cozinha. Os pratos de sopa dos meus vizinhos estão enfileirados no balcão. O meu junta-se aos deles. 12h50 As sopas esfriam. O cozinheiro aproxima-se do balcão com um pano de prato de 1950. Em uso. E limpa as bordas das tigelas de sopa. Hummmmm... Tempero da casa. 12h52 A sopa chega em minha mesa. Experimento. Está boa. Os vizinhos reclamam que seus pedidos não vieram conforme solicitado. Eu decido escrever. Minha taça está pela metade. Devo pedir outra? 13h00 O restaurante continua com apenas 3 mesas ocupadas. Na cozinha 7 pessoas trabalham. No salão, 9. (Pode haver desemprego neste país?). 13h05 Não vou pedir outra taça. Peço para vir meu prato principal (as cabeças de lulas grelhadas). 13:10 Chega o meu prato: “Tentáculos Tenros com Muitas Ventosas de Lulas Idosas a Milanesa”. Ah! Acompanhado com, batatas “fritas” morrendo afogadas no óleo. 13h12 Peço a conta. 13h13 A mesma chega. Com o gerente se desculpando e perguntando se o prato não estava “do meu gosto”. Preferi sorrir e agradecer.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Eu queria um misto-quente

Aqui em Moçambique temos que ter cuidado ao nos expressar. A língua, apesar de ser oficialmente a mesma que falamos, tem muitas diferenças. Diminutivos nem sempre são entendidos, gerundios nem pensar!, formalidades são exigidas, e frases coloquiais devem ser abortadas. Sem falar do vocabulário! Xícara é chávena, vaso sanitário é sanita, varal de roupas é estendal, isopor é esferovite, mesa de escritório é secretária, escritório é gabinete, van é carrinha, bolsa é pasta, legal é giro, de graça é de borla e carona é boleia. Pequeno dicionário da língua portuguesa. Se eu quero chamar um garçom no restaurante devo falar: “se faz favor”; se eu quero dizer que entendi o que estão me falando, eu digo: “percebi”, se estou te falando algo, “estou a dizer”, se algo demora muito: “há de vir”, se quero jogar um papel no lixo, peço para “deitar fora”, eu não coloco uma blusa de frio, eu “meto uma camisola “, e por aí vai... Um dia cheguei no escritório cedo e não havia ainda tomado meu café-da-manhã (não havia mata-bichado, ou tomado meu mata-bicho), e fui pedir então para um ajudante comprar um misto-quente para mim (uma tosta-mista), ou um sanduíche qualquer (uma sandes), na lanchonete (pastelaria – mas não vende os nossos pastéis, e sim bolinhos e sanduíches). Eu disse (rasgando o meu moz-português): - Sr. Paulo, se faz favor, podes ir na pastelaria para mim? Eu queria uma tosta-mista. E ele, rindo da minha ignorância: - Não Dona ... A senhora não QUERIA uma tosta-mista. A senhora QUER uma tosta-mista. Eu concordei.